Introdução à uma história do cinema
O cinema enquanto tecnologia é fruto de uma série de experimentos e invenções do final do século XIX, que tinham como objetivo criar a ilusão de movimento, muitas vezes com fotografias tiradas em sequencia numa frequência de fração de segundo.
Assim, já do ano de 1894 datam alguns filmes realizados, assinados pelo empresário Thomas Edison, nos EUA. Estes filmes não traziam histórias, mas algumas apresentações tais quais as que se viam nos circos na época. Índígenas dançando, mulheres atiradoras, gatos boxeadores e outras coisas “extraordinárias”.
Em 28 de dezembro 1895 na França os irmãos Auguste e Louis Jean Lumière realizam a (considerada) primeira exibição pública de cinema comercial, no Grand Café de Paris. Exibiram dez filmes, começando pelo famoso “A Saída da Fábrica Lumière em Lyon”.
A graça dos filmes dos Lumiére também não residia em algo genial (na verdade na época era), era simplesmente o registro de cenas cotidianas da cidade, da vida moderna, mas desta vez as imagens se mexiam, o que já era o suficiente para impressionar a maioria das pessoas.
Com o tempo este simples registro do cotidiano foi perdendo a graça; pessoas saindo da fábrica, um trem chegando, uma família tomando chá da tarde... Passada um pouco a euforia da descoberta da imagem em movimento, era necessário algo mais para dar graça ao cinema. Assim eram incluídas algumas piadinhas aos filmes. Assim como pode ser vista a histórinha do menino que pisa na mangueira, que podemos ver entre os filmes do link abaixo.
Ainda na última década do século XIX, um ilusionista francês chamado George Meliés, que havia presenciado a sessão do Grand Café de Paris, se encanta com o cinematógrafo, mas não consegue comprá-lo dos Lumiere, fabrica então o seu próprio, chamado “kinetógrafo” e começa a fazer experimentos. Diz a lenda que numa de suas filmagens a câmera travou enquanto filmava a passagem de um ônibus e voltou a funcionar quando passava um carro funerário. Na hora de ver o filme pronto, ele notou que essa travada causava um efeito especial, o ônibus se transformava no carro funerário, num clássico efeito do tipo “Chapolin”. Assim, ele começa a fazer ilusionismo no cinema. Isso traz uma nova vida para o cinema, que passa agora a ser de fato um tipo de arte, sua mágica foi redescoberta.
Na primeira década do século XX, o ex-jornalista do sul dos EUA, D. W. Griffith começa a estudar diversas técnicas de enquadramento e montagem para desenvolver melhor a narrativa e utilizar nos filmes que contavam histórias, que na época já tinham se tornado populares.
Em 1915, Griffith lança seu famoso filme “O nascimento de uma nação”, trazendo diversas inovações estéticas, aperfeiçoando a forma de contar histórias pelo cinema. Até então os filmes eram feitos com câmera parada, enquadramentos que mostravam a cena toda, e poucos filmes cortavam de um local para o outro, quando o faziam, faziam de forma linear, do tipo “acontece isso, depois aquilo”. Griffith trouxe para o cinema uma forma de narrativa comum na literatura, o “enquanto isso, acontece aquilo”, mostrando simultaneamente os acontecimentos em dois ou mais lugares, a chamada montagem paralela. Este filme é considerado o precursor da linguagem clássica de cinema, o melodrama. Até hoje os filmes, seriados e novelas se utilizam desse estilo de narrativa para contar histórias, assim foi estabelecido um estilo dominante no cinema.
Esta forma de cinema, com close-ups, cortes, acontecimentos paralelos, traz uma sensação de onisciência, a história contada é, dessa forma, cada vez menos questionável.
Tal narrativa, pode-se dizer, não é imparcial, demonstra e defende uma determinada visão de mundo, colocando o espectador numa situação de passividade, dominando-o pelas paixões despertadas pelas cenas e “reduzindo sua capacidade” de questionamento enquanto assiste o filme.
“O Nascimento de uma Nação” não é só o filme que inaugura a linguagem clássica de Hollywood e a era dos longas-metragens, mas é também, provavelmente o filme mais racista da história do cinema.
Mas não foi só no chamado Ocidente que o cinema se desenvolveu. Na União Soviética, nas primeiras décadas pós-revolução russa, o ambiente de grande entusiasmo revolucionário e a fé no socialismo soviético favoreceram uma grande efervescência cultural e florescimento artístico. Diversas vanguardas de arte surgiram neste período, buscando propagar o ideal socialista e enaltecer a revolução. O Estado patrocinou muito destes artistas, que trabalhavam com as diversas linguagens artísticas, pintura, poesia, teatro, música e cinema. Dentre os cineastas soviéticos que se destacaram devido suas inovações, técnica e criatividade, estão Dziga Vertov e Sergei Eisenstein.
Eisenstein conheceu Griffith e ambos se influenciaram mutuamente. No entanto Eisenstein não optou pelo melodrama como linguagem, sua linguagem era algo novo, que utilizava-se da montagem paralela, dos close-ups e tudo mais, mas com o intuito de trabalhar os significados.
Criou o que chamou de montagem intelectual, onde trabalha a evocação de significados a partir da relação entre dois planos. Esta técnica é inspirada no estudo de Lev Vladimirovich Kuleshov, onde o autor filmava um plano de um ator com uma expressão neutra e intercalava com um prato de sopa, depois intercalava com uma criança dentro de um caixão e depois com uma mulher no sofá; em cada uma das combinações, a impressão causada no publico sobre a expressão do ator era diferente; no caso da sopa, a impressão era que o ator estava com fome, no caso da criança morta a impressão era de tristeza e no caso da mulher a impressão era de desejo. O plano do ator, no entanto era sempre o mesmo. Assim conclui-se que “plano A + plano B = significado C”, como pode-se ver no video a seguir.
O cinema de Eisenstein, então, trabalha no nível dos significados, utiliza-se da interpretação (já prevista) do público para passar sua mensagem.
Como vemos no filme Outubro, as imagens não têm um significado literal, mas simbólico. Como a destruição e depois reconstrução da estátua do Czar, precedida de imagens religiosas, onde o autor mostra primeiro a derrubada do governo e depois sua retomada ao poder com auxílio das instituições religiosas.
O uso de cortes rápidos é muito comum na obra dele, assim ele trabalha também com a forma e composição de cada plano. Por exemplo, a alternância entre a imagem de um rosto arredondado e a de um cristo com uma espécie de estrela atrás de si, remete à imagem de uma explosão (video abaixo, minuto 1:18)
Já Dziga Vertov caracteriza-se pelo que é chamado de cinema-verdade, um dos precursores do documentário. Trata-se de filmar a realidade, sem cenas montadas/criadas, “a vida como ela é”. Mas, claro com o olhar do diretor. Vertov, em seu famosos filme “O homem com uma câmera”, faz questão de mostrar ao expectador que aquilo é um filme (diferente do melodrama, que se passa por realidade) feito por trabalhadores, mostra como ele é feito, enaltecendo os avanços científicos e tecnológicos tragos pelo socialismo. Num ritmo acelerado, repleto de cenas urbanas geométricas, este filme traz a imagem de uma Rússia moderna, rápida, rica em trabalho, ciências, bem estar... tudo fruto da revolução e do progresso socialista trago com ela.
Assim, já do ano de 1894 datam alguns filmes realizados, assinados pelo empresário Thomas Edison, nos EUA. Estes filmes não traziam histórias, mas algumas apresentações tais quais as que se viam nos circos na época. Índígenas dançando, mulheres atiradoras, gatos boxeadores e outras coisas “extraordinárias”.
Em 28 de dezembro 1895 na França os irmãos Auguste e Louis Jean Lumière realizam a (considerada) primeira exibição pública de cinema comercial, no Grand Café de Paris. Exibiram dez filmes, começando pelo famoso “A Saída da Fábrica Lumière em Lyon”.
A graça dos filmes dos Lumiére também não residia em algo genial (na verdade na época era), era simplesmente o registro de cenas cotidianas da cidade, da vida moderna, mas desta vez as imagens se mexiam, o que já era o suficiente para impressionar a maioria das pessoas.
Com o tempo este simples registro do cotidiano foi perdendo a graça; pessoas saindo da fábrica, um trem chegando, uma família tomando chá da tarde... Passada um pouco a euforia da descoberta da imagem em movimento, era necessário algo mais para dar graça ao cinema. Assim eram incluídas algumas piadinhas aos filmes. Assim como pode ser vista a histórinha do menino que pisa na mangueira, que podemos ver entre os filmes do link abaixo.
Ainda na última década do século XIX, um ilusionista francês chamado George Meliés, que havia presenciado a sessão do Grand Café de Paris, se encanta com o cinematógrafo, mas não consegue comprá-lo dos Lumiere, fabrica então o seu próprio, chamado “kinetógrafo” e começa a fazer experimentos. Diz a lenda que numa de suas filmagens a câmera travou enquanto filmava a passagem de um ônibus e voltou a funcionar quando passava um carro funerário. Na hora de ver o filme pronto, ele notou que essa travada causava um efeito especial, o ônibus se transformava no carro funerário, num clássico efeito do tipo “Chapolin”. Assim, ele começa a fazer ilusionismo no cinema. Isso traz uma nova vida para o cinema, que passa agora a ser de fato um tipo de arte, sua mágica foi redescoberta.
Em 1915, Griffith lança seu famoso filme “O nascimento de uma nação”, trazendo diversas inovações estéticas, aperfeiçoando a forma de contar histórias pelo cinema. Até então os filmes eram feitos com câmera parada, enquadramentos que mostravam a cena toda, e poucos filmes cortavam de um local para o outro, quando o faziam, faziam de forma linear, do tipo “acontece isso, depois aquilo”. Griffith trouxe para o cinema uma forma de narrativa comum na literatura, o “enquanto isso, acontece aquilo”, mostrando simultaneamente os acontecimentos em dois ou mais lugares, a chamada montagem paralela. Este filme é considerado o precursor da linguagem clássica de cinema, o melodrama. Até hoje os filmes, seriados e novelas se utilizam desse estilo de narrativa para contar histórias, assim foi estabelecido um estilo dominante no cinema.
Esta forma de cinema, com close-ups, cortes, acontecimentos paralelos, traz uma sensação de onisciência, a história contada é, dessa forma, cada vez menos questionável.
Tal narrativa, pode-se dizer, não é imparcial, demonstra e defende uma determinada visão de mundo, colocando o espectador numa situação de passividade, dominando-o pelas paixões despertadas pelas cenas e “reduzindo sua capacidade” de questionamento enquanto assiste o filme.
“O Nascimento de uma Nação” não é só o filme que inaugura a linguagem clássica de Hollywood e a era dos longas-metragens, mas é também, provavelmente o filme mais racista da história do cinema.
Mas não foi só no chamado Ocidente que o cinema se desenvolveu. Na União Soviética, nas primeiras décadas pós-revolução russa, o ambiente de grande entusiasmo revolucionário e a fé no socialismo soviético favoreceram uma grande efervescência cultural e florescimento artístico. Diversas vanguardas de arte surgiram neste período, buscando propagar o ideal socialista e enaltecer a revolução. O Estado patrocinou muito destes artistas, que trabalhavam com as diversas linguagens artísticas, pintura, poesia, teatro, música e cinema. Dentre os cineastas soviéticos que se destacaram devido suas inovações, técnica e criatividade, estão Dziga Vertov e Sergei Eisenstein.
Eisenstein conheceu Griffith e ambos se influenciaram mutuamente. No entanto Eisenstein não optou pelo melodrama como linguagem, sua linguagem era algo novo, que utilizava-se da montagem paralela, dos close-ups e tudo mais, mas com o intuito de trabalhar os significados.
Criou o que chamou de montagem intelectual, onde trabalha a evocação de significados a partir da relação entre dois planos. Esta técnica é inspirada no estudo de Lev Vladimirovich Kuleshov, onde o autor filmava um plano de um ator com uma expressão neutra e intercalava com um prato de sopa, depois intercalava com uma criança dentro de um caixão e depois com uma mulher no sofá; em cada uma das combinações, a impressão causada no publico sobre a expressão do ator era diferente; no caso da sopa, a impressão era que o ator estava com fome, no caso da criança morta a impressão era de tristeza e no caso da mulher a impressão era de desejo. O plano do ator, no entanto era sempre o mesmo. Assim conclui-se que “plano A + plano B = significado C”, como pode-se ver no video a seguir.
O cinema de Eisenstein, então, trabalha no nível dos significados, utiliza-se da interpretação (já prevista) do público para passar sua mensagem.
Como vemos no filme Outubro, as imagens não têm um significado literal, mas simbólico. Como a destruição e depois reconstrução da estátua do Czar, precedida de imagens religiosas, onde o autor mostra primeiro a derrubada do governo e depois sua retomada ao poder com auxílio das instituições religiosas.
O uso de cortes rápidos é muito comum na obra dele, assim ele trabalha também com a forma e composição de cada plano. Por exemplo, a alternância entre a imagem de um rosto arredondado e a de um cristo com uma espécie de estrela atrás de si, remete à imagem de uma explosão (video abaixo, minuto 1:18)
Já Dziga Vertov caracteriza-se pelo que é chamado de cinema-verdade, um dos precursores do documentário. Trata-se de filmar a realidade, sem cenas montadas/criadas, “a vida como ela é”. Mas, claro com o olhar do diretor. Vertov, em seu famosos filme “O homem com uma câmera”, faz questão de mostrar ao expectador que aquilo é um filme (diferente do melodrama, que se passa por realidade) feito por trabalhadores, mostra como ele é feito, enaltecendo os avanços científicos e tecnológicos tragos pelo socialismo. Num ritmo acelerado, repleto de cenas urbanas geométricas, este filme traz a imagem de uma Rússia moderna, rápida, rica em trabalho, ciências, bem estar... tudo fruto da revolução e do progresso socialista trago com ela.
Um
pouco antes do “Homem com uma câmera” na URSS, Robert Flatherty,
cineasta norte-americano realiza o documentário “Nanook, o Esquimó” em
1922. O filme inaugura o gênero documentário longa-metragem. É
considerado o primeiro e um dos mais importantes filmes antropológicos.
Neste filme, Flatherty mostra a cotidiana luta pela sobrevivência do
esquimó Nanook e sua família no norte do Canadá, onde as condições de
vida são extremas principalmente no inverno. Apesar de seu caráter
documental, nota-se algumas pequenas encenações no filme, o que
demonstra que mesmo documentários são pontos de vista do autor, que
passa seus preconceitos e estereótipos. (Ver minuto 12:55, onde Nanook
conhece do toca discos e a sequencia onde seu filho passa mal e toma
óleo de castor)
É possível percebermos a localização das pessoas, seus movimentos, tudo muito bem sincronizado para o bem do cinema.
É possível percebermos a localização das pessoas, seus movimentos, tudo muito bem sincronizado para o bem do cinema.
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